A Anvisa e o crescimento do mercado ilegal

O mercado ilegal no país segue crescendo em ritmo acelerado. Infelizmente e, apesar de algumas iniciativas do governo e da indústria, ainda estamos longe de resolver esse grave problema.
Um dos setores mais afetados pela ilegalidade é o de cigarros: se somarmos o contrabando e a falsificação, o comércio ilegal de cigarros chegou a 48% do total de produtos vendidos no país em 2017. Para se ter uma ideia do crescimento do problema, em 2016 esse percentual era de 32%.
Nesse contexto, é preocupante pensar que as agências reguladoras, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), estejam mais preocupadas em controlar os produtos legais que circulam no país do que fiscalizar os ilegais. Nesta quarta-feira (22), o debate sobre a restrição ao uso de ingredientes nos cigarros volta ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A questão é antiga: uma resolução da Anvisa de 2012 proibiu aditivos na fabricação de produtos à base de tabaco. A normativa só não entrou em vigor por uma ação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) no STF, que apontou ilegalidade na medida adotada pela agência sanitária.
A CNI questiona, especialmente, trecho sobre a proibição da fabricação e venda de produtos em casos de “risco à saúde”. Mas não existem estudos que comprovem que esses ingredientes que compõem o cigarro causem riscos à saúde.
Segundo o Centro Nacional de Informação Biotecnológica, um dos braços do National Institutes of Health do governo dos Estados Unidos, o consumo de cigarros com sabor não aumenta o risco de efeitos nocivos se comparado ao de cigarros tradicionais.
Este é um tema da maior importância, pois em última instância trata do escopo e dos limites da atuação das agências reguladoras brasileiras. Teria a Anvisa o poder de legislar? Obviamente, não. Agências reguladoras são autarquias, podendo apenas exercer fiscalização de leis previamente estabelecidas.
Da forma como foi apresentada, a resolução da Anvisa proibiu aditivos de forma genérica, restringindo o uso nos cigarros apenas a tabaco e água.
Ou seja, todos os cigarros vendidos legalmente no Brasil seriam banidos, pois a fabricação do produto ficaria praticamente inviabilizada, entregando este mercado para ao contrabando —que com certeza agradecerá, e muito, essa dádiva bilionária. É certo que restrições de tamanho impacto econômico apenas podem ser efetuadas pelo Congresso Nacional.
Caso a decisão seja mantida, os brasileiros que optarem por consumir cigarros com sabor terão de recorrer aos produtos ilegais.
Os fabricantes paraguaios e as quadrilhas que hoje dominam esse comércio no Brasil teriam um estímulo ainda maior para trazer produtos que preencham essa lacuna de mercado.
É importante ressaltar que não estamos negando o importante papel das agências sanitárias na fiscalização de um setor que tem sido dominado por produtos ilegais. A Anvisa e as secretarias de vigilância sanitária dos municípios têm a função de fiscalizar a qualidade e a composição de produtos destinados ao consumo.
Essa ação é necessária para garantir que produtos vendidos no país sejam seguros, mas a agência precisa atuar dentro dos limites da legislação.
Suas decisões precisam ser baseadas em dados provenientes de estudos que comprovem as teses defendidas, de forma a garantir transparência em suas decisões. O que precisamos, com a maior urgência, é ampliar as medidas de fiscalização, já que temos quase metade do mercado de cigarros do país sem nenhum controle sanitário, com evidente e comprovado prejuízo para o consumidor e para a sociedade.