NFTs dão visibilidade para a arte, dizem artistas da Havaianas e Casa NFT

Artistas brasileiros envolvidos em grandes projetos de NFTs do país dão suas considerações sobre a experiência de trabalhar envolvendo a arte e a tecnologia blockchain

Até pouco tempo atrás, ninguém além de alguns poucos entusiastas da tecnologia blockchain sabia o que eram os NFTs. De lá para cá, este mercado movimentou mais de US$ 60 bilhões, gerando visibilidade e receita para diversos artistas.

Os NFTs, ou tokens não fungíveis, são uma espécie de registro em blockchain que comprova a autenticidade e exclusividade de determinado item. Embora os NFTs possam representar qualquer coisa, eles se tornaram mais conhecidos a partir da arte digital.

Coleções como Bored Ape Yacht Club, CryptoPunks e Azuki são algumas das protagonistas do fenômeno que tomou conta do mundo todo durante a pandemia de coronavírus, onde as interações se tornaram ainda mais digitais. Com isso, tornou-se comum utilizar criptomoedas para comprar certificados digitais, e os NFTs viraram as fotos de perfil de muitas pessoas nas redes sociais, principalmente famosos.

Paris Hilton, Eminem, Madonna, Neymar, Snoop Dogg e Gwyneth Paltrow são apenas alguns dos nomes de uma extensa lista de celebridades que investiram nos tokens não fungíveis.

Embora ainda não tenham sido amplamente adotados pela população de massa, o impacto desta nova tecnologia para o mundo é inegável. Além de ter movimentado quantias bilionárias, os NFTs representam uma nova forma de atuação para artistas. Sejam aqueles que criam artes digitais, ou físicas, que podem ser digitalizadas posteriormente.

É o caso de Adhemas Batista e Henrique Montanari, dois brasileiros que já trabalharam em projetos da Havaianas e da Casa NFT, respectivamente. Enquanto Adhemas é especializado em arte digital, Montanari usa o pseudônimo EDMX para grafitar pelas ruas do país.

Ambos se viram diante de uma oportunidade inédita em suas vidas quando foram convidados para estes grandes projetos de tokens não fungíveis em 2021. O ano foi marcado pela estreia de diversas marcas e grandes empresas no setor, o que colaborou para que artistas como eles despontassem na utilização da tecnologia blockchain para representar seus trabalhos artísticos.

“Acho que traz mais liberdade e validação ao trabalho. Apesar de estar tudo muito nebuloso, existe uma boa perspectiva para o futuro”, declarou Adhemas em entrevista exclusiva à EXAME, apontando que o mercado de NFTs ainda é muito incipiente para fazer afirmações sobre seu desenvolvimento.

O artista, que ganhou destaque com os primeiros NFTs da Havaianas em maio de 2021, tinha conhecido e experimentado a tecnologia alguns meses antes. Apesar de brasileiro, Adhemas mora em Los Angeles, nos Estados Unidos, desde 2006. Por lá, os NFTs estão ainda mais presentes na sociedade do que no Brasil.

“O mercado de NFTs está bastante difundido nos EUA, mais e mais pessoas entendem do que se trata”, revelou.

NFTs da Havaianas

O nome de Adhemas Batista já era um velho conhecido do grupo Alpargatas, responsável pela Havaianas. Os dois já trabalhavam juntos há mais de 15 anos quando surgiu a ideia de criar os primeiros NFTs da marca.

“O time de produto criou a ‘Sandália Virtual’ e eu dei vida com o a minha arte. Foi um processo muito rápido pois queríamos ser pioneiros”, contou Adhemas, à EXAME. De fato, a Havaianas se consagrou como uma das primeiras entre as grandes empresas brasileiras a criar seus próprios NFTs.

 (Havaianas/Adhemas Batista/Divulgação)

A criação dos NFTs que representavam a arte de Adhemas foi uma explosão de emoções para o artista e o time envolvido no projeto, que se destacou pela liberdade de criação. “Vibramos juntos a cada peça que subia na plataforma e se tornava um NFT. Outro fato importante é que a Havaianas me deu liberdade completa para criar e eu não tive que fazer nenhuma revisão. Algo que não é comum nessa indústria”, revelou Adhemas.

Casa NFT

Ainda em 2021, outro projeto brasileiro ganhou destaque no universo dos NFTs. A Casa NFT se inspirou na efemeridade da arte de Banksy, conhecido por ter triturado uma de suas obras mais famosas, “Girl with Balloon” após uma venda milionária, e queimado outra, “Morons”, após tê-la transformado em NFT.

E quando falamos de efemeridade, nada mais adequado do que o grafitti, protagonista da arte urbana, em uma casa prestes a ser demolida. O projeto contou com 130 obras de 73 artistas, além do apoio da construtora Gamboa, que abraçou a ideia e permitiu sua realização antes de uma demolição programada para agosto de 2021 de uma mansão no Morumbi, em São Paulo.

Alexandre Travassos, o idealizador do projeto, não tem dúvidas de que os tokens não fungíveis representam uma evolução para o reconhecimento de artistas, e justifica que na Casa NFT, “o processo de criação foi livre para que cada artista pudesse se expressar da forma que preferisse, quanto a técnica, temas e cores. Inclusive, para inovar e fazer novas experiências”.

Foram disponibilizadas apenas as tintas e materiais aos artistas, além da própria casa. Todos eles realizaram seus trabalhos artísticos por interesse no projeto, que transformou todos os cantos da casa em arte. Antes da demolição, fotos dos trabalhos foram eternizadas no blockchain através dos NFTs.

“Procurei utilizar ao máximo o suporte que a casa me ofereceu. Em minhas obras, eu mantive a textura do papel de parede original como fundo da pintura e coloquei as imagens poeticamente para se integrarem ao ambiente”, contou Henrique Montanari, o EDMX, em entrevista à EXAME.

– (Casa NFT/EDMX/Divulgação)

O artista também acredita no potencial dos NFTs para empoderar o artista, e citou alguns colegas que trabalham com a arte digital. “Muitos amigos artistas digitais estão conseguindo entrar no mercado da arte através do NFT já que o mercado de arte tradicional é muito fechado”, contou.

Os benefícios de fazer arte registrada por meio de tokens não fungíveis seria a possibilidade de atingir ainda mais pessoas. “Tendo o NFT como plataforma agora é possível atingir um público muito maior e mostrar que também podemos fazer arte e não só comerciais”, acrescentou Montanari.

Depois da Casa NFT, EDMX revelou ter participado de outros projetos de NFTs, como o ArtMonkees, uma coleção inspirada em toy art. Segundo o artista, a primeira coleção, de 5 mil NFTs, esgotou em apenas 4 minutos, demonstrando que o interesse dos compradores está cada vez maior por este tipo de arte, que engloba também uma nova forma de investimento, já que os NFTs podem valorizar com o tempo, dependendo de alguns fatores.

“Acredito que o NFT veio dar um estímulo maior aos artistas que trabalham muito com tecnologia. Hoje, um artista 3D pode colocar sua peça de animação, modelagem ou motion graphics a venda como obra de arte no blockchain. Antigamente essas peças serviam apenas para portfólio ou para fazer parte de algum filme ou propaganda”, disse Montanari, à EXAME.

O futuro dos NFTs

No entanto, Adhemas Batista pontuou que é preciso cuidado na hora de apostar em um NFT, já que existem pessoas envolvidas no setor apenas para ganhar dinheiro, sem a devida valorização da arte.

“Acho que ainda temos um grande caminho para que os NFTs e os especuladores de cripto entendam o real valor da arte, a paixão e a história dos artistas e o envolvimento para criar peças que realmente são obras de arte”, comentou, acrescentando que “A grande maioria das NFTs são feitas apenas com o objetivo de ganhar dinheiro e são produzidas como linha de montagem em fábrica ou apenas algo rápido sem sentido somente para ganhar dinheiro”.

O próprio Adhemas teria participado de projetos do tipo, por conta de sua rotina profissional. Com isso, tirou alguns aprendizados.“Eu mesmo estive envolvido em um projeto desses, onde se cria peças em escala, e consegui aprender mais sobre o mercado e como a tecnologia funciona”, revelou.

“Tudo é muito novo, está se movendo rápido, mas ainda é o começo. Não temos um manual de boas práticas, estamos construindo tudo juntos, errando bastante e colhendo alguns bons frutos. Conforme o mercado de NFTs progredir, será muito importante para todos os artistas de forma geral”, concluiu.

Os NFTs não se tornaram parte essencial de nossas vidas – ainda. Cada vez mais empresas investem na tecnologia e a integram em seus negócios, como o Facebook, Instagram e Twitter, que desenvolvem funcionalidades para o uso dos tokens não fungíveis nas redes sociais.

Uma pesquisa recente da Chainalysis revelou que 2021 tenha sido o ano do “boom dos NFTs”, mas que 2022 promete um crescimento ainda mais expressivo. Apenas no primeiro trimestre de 2022, 1 milhão de carteiras compraram ou venderam um NFT. No quarto trimestre de 2021, este número foi de 600 mil.

Enquanto a Havaianas ainda não anunciou novos projetos envolvendo NFTs, a Casa NFT já tem ideias ainda mais ambiciosas que no início. Apesar da ideia inicial ser de apenas comercializar NFTs, agora a organização do projeto realizará uma exposição na Funarte, em São Paulo, chamada “Entre o físico e o digital”, nos meses de julho e agosto de 2022.

“O projeto cresceu e vimos que durante todo processo foi criado um imenso acervo digital, e com isso surgiu a ideia de montarmos uma exposição da Casa NFT”, revelou Alexandre Travassos, o idealizador do projeto.

Nos meses seguintes, a exposição viajará por outros estados do Brasil e uma nova Casa NFT está nos planos. Ela deve acontecer até o final deste ano, de acordo com Travassos.

Fonte e Imagem : Future of Money exame.