Veja como a lei de proteção de dados pode limitar o acesso e o compartilhamento de suas informações pessoais

O pagamento será via cartão de crédito, mesmo assim, a atendente pede informações como CPF, e-mail, celular, endereço. Na farmácia, a mesma coisa, o cadastro do CPF virou rotina e é condição para obter descontos. E para baixar o aplicativo, é preciso permitir o rastreio da sua localização. Mas afinal, as empresas precisam de todos esses dados para prestar o serviço? Como usam essas informações? Com quem compartilham?

Em vigor há dez dias, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) ajudará o consumidor a obter respostas para estas perguntas. E, mais do que isso, responsabiliza as empresas pela privacidade dos dados de seus clientes, assim como pune as que os obtiverem sem consentimento e sem informar a finalidade dessa coleta. As multas, que serão aplicadas a partir de agosto de 2021, vão até 2% do faturamento, limitadas a R$ 50 milhões.

“Até agora, o consumidor tinha poucos instrumentos para obter essas informações, era preciso entrar com uma ação, que podia levar uma década em tramitação. Com a lei, o consumidor pode questionar a empresa sobre quais os dados ela coleta e qual a finalidade e há um prazo de 15 dias para responder. A LGPD nos dá meios para reclamar de práticas que incomodam diariamente a todos”, diz Danilo Doneda, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público e indicado pela Câmara dos Deputados ao Conselho Nacional de Proteção de Dados.

O advogado Raphael Zanatta, diretor da Data Privacy Brasil, diz que, em algumas plataformas, o consumidor já consegue fazer o download das informações armazenadas a seu respeito:

“Fiz essa experiência e acabei decidindo deletar uma das minhas redes sociais ao verificar a enorme quantidade de dados que mantinham. É importante fazer essa reflexão: vale a pena ceder todas essas informações? E entender que seus dados têm valor financeiro para as empresas”.

Michel Roberto de Souza, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), chama atenção para o fato de que a lei deixa claro que os dados são propriedade do consumidor:

“A empresa que trata os dados precisar pedir sua autorização e trabalhá-los com transparência e segurança, visto que o vazamento leva a riscos”.

A aposentada Maria Helena Graça, de 66 anos, desconfia que seus dados tenham vazado ou sido negociados sem sua anuência.

Desde que chegou a carta de concessão de sua aposentadoria, em março, recebe, em média, quatro ligações por dia com ofertas de crédito consignado, cartão e seguro-saúde de empresas com as quais nunca teve relação:

“Já bloqueei cerca de 80 telefones, mas eles voltam a ligar. Se não atendo, ligam até para minhas filhas. Não sei como meus dados foram parar nestas empresas, não autorizei ninguém a repassá-los”.

A estudante Manuella Caputo, de 23 anos, se queixa do monitoramento da sua navegação na internet, o que fica evidente, diz, com os anúncios e mensagens que recebe. Com a vigência da lei, ela espera que termos de privacidade fiquem mais claros:

“Os termos de uso costumam ser longos e com um “juridiquês” difícil de entender. Agora que a lei está em vigor, ficarei mais atenta a isso.”

Aline Zinini, advogada especialista em direito digital do Kasznar Leonardos Propriedade Intelectual, diz que a lei exige termos de uso mais claros:

“As empresas entenderam também que isso será importante para sua proteção, para garantir que houve consentimento informado. Já há documentos interativos e até com desenhos. Mas é importante que as pessoas criem o hábito de ler a política de privacidade”.

A proteção de dados é um dos focos da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão do Ministério da Justiça, onde há 34 processos abertos sobre uso de dados sem consentimento.

“Agíamos baseados no Código de Defesa do Consumidor, a LGPD reforça nossa atuação, com normas específicas. A proteção do consumidor na área digital é cada vez mais relevante, ainda mais após o aumento de mais 200% de usuários de plataformas digitais na pandemia”, diz Juliana Domingues, titular da Senacon.


Fonte: OSUL | Clipping: LDSOFT
Foto: OSUL