Ipea e MCTIC sugerem mudanças na pesquisa de inovação do IBGE

A necessidade de aperfeiçoar a Pesquisa de Inovação Tecnológica (Pintec), criada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2000 e divulgada a cada três anos, foi um dos destaques do seminário realizado na tarde desta quinta-feira, 02, na sede do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), em Brasília. O evento discutiu os resultados da 6ª edição da pesquisa (a última), divulgada em dezembro passado (disponível aqui), com a presença dos dirigentes e servidores da pasta.

A diretora de Estudos e Políticas Setoriais de Inovações e Infraestrutura do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Fernanda De Negri, defendeu o aprimoramento da pesquisa a fim de identificar o motivo pelo qual a inovação no Brasil “não decola”, apesar do aperfeiçoamento das políticas públicas da área de ciência, tecnologia e inovação – como a criação da Lei do Bem e o aumento da oferta de linhas de crédito pela Finep e BNDES.

A especialista criticou o fato de o Brasil ser um mercado fechado tanto aos negócios como às novas “ideias” externas e sugeriu incluir, por exemplo, na próxima edição da Pintec, os números de pesquisadores estrangeiros dentro das empresas brasileiras, que acredita ser “muito pequenos”.

“Conseguimos obter, pelo cadastro no Ministério do Trabalho, pela RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), os dados de imigração de mão de obra qualificada. Mas não sabemos quantos deles trabalham dentro das empresas brasileiras”.

Para ela, incluir esses dados na pesquisa seria muito positivo para mensurar a diversidade dos pesquisadores internamente, a exemplo da última pesquisa que incluiu o número de mulheres.

Os técnicos do MCTIC também sugeriam incluir, na sondagem, o impacto das empresas que utilizam os incentivos da Lei do Bem. Atualmente, eles encaminham ao IBGE os investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) realizados pelo setor industrial. Contudo, o gerente da Pintec, Alessandro Pinheiro solicitou os dados relacionados à renúncia concedida pelo governo federal às empresas para serem incluídos na pesquisa.

Gargalos econômicos

De acordo com o gerente da Pintec, a aquisição de bens capitais (máquina e equipamentos) ainda é a principal inovação do setor industrial. Para ele, essa é a inovação mais simples que existe e concorda que o ambiente econômico desfavorável é um gargalo. “Não temos um ambiente de negócios favorável às empresas para fazer P&D no Brasil”.

Para o Brasil recuperar o atraso no cenário internacional, Pinheiro destaca que o País precisa “investir muito mais do que investe hoje” e que os próximos resultados da Pintec devem piorar, em razão da recessão econômica que inibe os investimentos em P&D.

Já a pesquisadora do Ipea, De Negri, reiterou as críticas sobre o fato de a economia brasileira ser muito fechada à competição, internamente. E criticou ainda o fechamento a ideias externas inovadoras.

“Achamos que estrangeiro não pode dar pitacos à nossa economia e inovação. Enquanto não rompermos com essas barreiras, continuaremos tendo dificuldade para inovar. Criamos os estímulos de políticas públicas para inovar, mas falta o estímulo da concorrência”, considerou.

De Negri discorreu sobre práticas internacionais, citando o exemplo de duas empresas que competem no mercado mundial. “Por que a Apple lança um celular novo todo ano?”, questionou e respondeu: “Porque se ela não lançar uma ‘novidadezinha’ todo ano, que faça valer à pena o consumidor trocar o aparelho velho pelo novo, vem a Samsung e faz isso.”

Burocracia

A especialista do Ipea criticou ainda a morosidade no processo de abertura de uma empresa, que, segundo ela, também inibe a competição. “Isso reduz a concorrência, porque os entrantes são as empresas inovadoras, como startups”, destacou.

Para ela, a inovação depende da diversidade. “Se estou falando como os meus pares, com os iguais que pensam como eu, não sou intelectualmente desafiada a criar. Mas se tem alguém que pensa diferente, isso faz com que pensamos um pouco fora do nosso arcabouço mental e isso leva à inovação”, destacou.

Nesse quesito, a diretora do Ipea criticou também a cultura das universidades. “As universidades são muito endógenas a novas ideias. Há fatores de fundo que reduzem a eficiência das nossas políticas públicas que poderiam ter tido mais impacto se tivéssemos condições mais favoráveis no ambiente de negócios”, disse.

Compras públicas de P&D

A diretora do Ipea analisou também os dados da pesquisa sobre a compra de produtos inovadores e defendeu mudanças na Lei nº 8.666/93, que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública. A Pintec revelou que menos de 1% das empresas são beneficiadas por essa política.

Segundo De Negri, o Ipea está desenvolvendo um estudo que sugere criar um mecanismo de aquisição de pesquisa e desenvolvimento (P&D) na Lei nº 8.666. Segundo ela, existe uma tentativa semelhante à proposta do Instituto, na Lei de Inovação (Lei nº 10.973/2004), no artigo 20, mas que nunca foi utilizada, até agora.

“Embora exista esse artigo 20, ninguém nunca o usou porque quando se fala em compra, o pessoal utiliza diretamente a Lei 8.666, e essa legislação não tem nenhuma regra explícita para investimento em P&D. Acho que fica todo mundo com medo de usar e todos acabam utilizando o ‘padrão’”, declarou.

A proposta do Ipea é semelhante à lei dos Estados Unidos (EUA), sobre a qual existe um capítulo relacionado à aquisição de P&D. “A nossa 8.666 consegue fazer licitação somente por preço fixo, e isso dificulta mensurar o preço de uma vacina que ainda não existe”, exemplificou e destacou que nos EUA existem vários métodos para mensurar o preço de um produto ainda em desenvolvimento. Um exemplo é o reembolso de custo da pesquisa.

“A nossa sugestão é exatamente isso, de incorporar nessa Lei um capítulo explícito sobre como poderia fazer a compra de P&D, com métodos de forma de pagamento e de remuneração que possibilitem adquirir algo que ainda está em desenvolvimento”, declarou.

Potencial inexplorado

Já o secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do MCTIC, Alvaro Prata, que mediou o evento, afirmou que as empresas brasileiras desconhecem o potencial que existe internamente, no caso de não utilizar os mecanismos permitidos na Lei da Inovação (artigo 20).

Ainda que reconheça o ambiente de negócios desfavorável, Prata avalia que esse fator não pode ser utilizado como desculpa para paralisar a inovação no setor produtivo. “Não existe dúvida de que precisamos simplificar o nosso sistema. Mas isso não deve ser justificativa para que os nossos empresários possam inovar.”

Prata analisou também o dado do total das empresas brasileiras que inovam pensando no mercado internacional (2,4%) e o considerou modesto. “Inovação tem de tornar nossas empresas mais competitivas”, disse e destacou ainda o dado que aponta baixa interação entre empresa e universidade.

“Me surpreende ver que, nesse processo de inovação, a indústria se apoia somente em 18% das universidades, que são as grandes detentoras do conhecimento”, disse e acrescentou: “Se quisermos informação mais especificas, de saber por que as empresas tiveram esse comportamento, precisamos atuar com o IBGE, para que nos produzam mecanismos.”

Fonte: Jornal da Ciência  Via:Agência de Inovação da UFSCar