Por que os engenheiros estão trabalhando no Uber?

Inovação, complexidade econômica e produtividade nacional.

Lucas Ruíz Balconi[i]

(Fonte: Estadão, 28 abril de 2019)[ii] 

Devemos compreender que a economia é sistema que tem estrutura e conjuntura e que, como tal, deve ser analisada como um ecossistema, um todo orgânico e inseparável em que o conjunto de unidades se inter-relaciona. Assim, de alguma forma, todos os atores e agentes econômicos dependem uns dos outros. Os “produtores”, por exemplo, garantem a “oferta”. Os consumidores, por sua vez, promovem o fluxo de demanda. Ainda, é essencial entender que o sistema capitalista, modo de produção vigente, é global. Isso quer dizer que há concorrência entre países e dependência econômica entre as nações.

Os países ricos produzem bens que possuem alto valor agregado. São desejados pelos consumidores, facilmente comercializáveis e muito sofisticados. “O sistema operacional Windows somente é produzido pela Microsoft, e tem pouca competição para ele, os telefones celulares Samsung e Apple também, os carros da Toyota, os aviões da Boeing e da Airbus e assim por diante”[i]. Quanto mais sofisticada é a estrutura produtiva de um determinado país, maior a chance de exportar o item produzido, ganhar competitividade e gerar riqueza.

Toma-se como exemplo os aparelhos celulares (smartphones). Tais produtos são feitos em poucos locais, como Estados Unidos e Coreia do Sul, mas são desejados, comercializados e exportados para diversos países, que não possuem capacidade ou tecnologia para produzir e competir por essa fatia de mercado.

Só para se ter uma ideia a Coreana Samsung teve, em 2017, o faturamento de USD 223,36 bilhões de dólares[ii] o que corresponde a 19,6% do PIB da Coreia do Sul[iii].

Essa indústria de produtos sofisticados gera, naturalmente, uma grande necessidade de empregos que, também, possuem alto valor, especialmente na área da Engenharia, porque dependem de know-how específico e especializado. Da mesma forma, cria uma grande cadeia de fornecedores de apoio, pois será necessária a fabricação de ferramentas, equipamentos e demais produtos para essa cadeia produtiva. Por fim, também gera uma cadeia de prestadores de serviços diferenciados e especializados depois que são produzidos a fim de que sejam comercializados (marketing, comercial, assistência técnica, revendas, entre outros).

O Brasil não possui industrialização de produtos sofisticados além de ser totalmente dependente de tecnologia externa para formar sua cadeia produtiva. Além de não ter sofisticação tecnológica, a produtividade industrial só cai, a saber

Por isso, o Brasil não consegue gerar empregos, também, sofisticados. Aqui, boa parte dos trabalhadores estão em setores de baixo desempenho em termos de produtividade. Ocupações que não dependem de conhecimento específico e diferenciado. Isso faz com que seja cada vez mais comum encontrar motoristas de Uber e ou do Ifood que possuem um bom diploma de ensino superior.

“Ao perder sua indústria, o Brasil perde o principal meio de transformar conhecimento/educação/capital humano em produtos, serviços e renda! Restará um pequeno setor de serviços altamente sofisticado e complexo para fazer essa conversão. O resto será IFood e uber!”[iv]

O Brasil tem sua produção focada no agronegócio de baixa complexidade[v] e faz a circulação do dinheiro pelo setor de serviços não escaláveis, sem produtividade, sem desenvolvimento tecnológico e com pouco valor agregado. Por isso, atualmente, o número de empregos mais qualificados está escasso.


[i] Advogado e sócio do escritório Balconi Moreti Advocacia da Inovação. Doutorando em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Direito Político e Econômico (UPM). Professor de graduação e pós-graduação. Coordenador da pós-graduação de Direito a Inovação (UNIFIL). E-mail: lucasrbalconi@gmail.com

[ii] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,aplicativos-como-uber-e-ifood-sao-fonte-de-renda-de-quase-4-milhoes-de-autonomos,70002807079media&utm_content=geral&utm_campaign=noticias&fbclid=IwAR0qqKYyV8eWgLvsi7aSh4cJAVTNvQkWaF0Pm2NuNTNJOP0r1tqoqkYB1QA

[i] GALA, Paulo; Almeida, Alberto. Uma história simples para se entender porque os países ricos são ricos hoje (e o Brasil não). Desnível em https://www.paulogala.com.br/uma-historia-simples-para-entender-porque-os-paises-ricos-sao-ricos-hoje-e-o-brasil-nao/. Acesso 30/09/2019.

[ii] Balanço anual pode disponível em https://www.samsung.com/global/ir/financial-information/audited-financial-statements/. Acesso 30/09/2019.

[iii] Disponível https://pt.countryeconomy.com/governo/pib/coreia-do-sul. Acesso 30/09/2019.

[iv] GALA, Paulo. Brasil: da indústria para o uber. Disponível em https://www.paulogala.com.br/brasil-da-industria-para-a-uber/. Acesso 30/09/2019.

[v] “O agronegócio pode gerar aumento de complexidade produtiva se os tratores, os químicos, as plantadeiras e colheitadeiras forem feitos domesticamente com competência, como Estados Unidos e Canadá, por exemplo, fizeram. Mas não há garantia de que isso ocorra. A agricultura pode simplesmente importar as máquinas e os produtos químicos de que necessita, e nesse caso o país continuará a ser uma grande fazenda high tech, que emprega pouca gente, basicamente para dirigir o trator, a plantadeira e a colheitadeira. O caminho do desenvolvimento mostra que é preciso, sim, produzir tratores, colheitadeiras, plantadeiras ou fertilizantes, ou algo complexo que não seja apenas soja, milho ou trigo”. GALA, Paulo. Complexidade Econômica: Uma nova perspectiva para entender a antiga questão da riqueza das nações. Editora: Contraponto. Rio de Janeiro, 2017. p. 38.

Fonte e autoria Dr. Lucas Balconi | Clipping LDSOFT